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“Será que o Judiciário está fazendo bem pra saúde?”, provoca o desembargador Gebran Neto
O desembargador João Pedro Gebran Neto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, fez várias provocações durante sua palestra – A Judicialização da Saúde Pública à Luz dos Principais Enunciados da III Jornada do Conselho Nacional de Justiça – nesta sexta-feira (6/9), durante o Fórum de Judicialização da Saúde, no auditório do Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO). “Será que o Poder Judiciário está fazendo bem pra saúde? Será que nós podemos replicar essa lógica para habitação, trabalho, educação ou para a segurança?”, indagou ao afirmar que a lógica constitucional do direito à saúde deveria valer para todos os direitos fundamentais.
“Será que o Poder do Judiciário é o mais legitimado para decidir onde construir uma escola, onde matricular um aluno, onde instalar um posto de segurança, se vai ter guarda na esquina de cada casa? Em suma, é isso que estamos fazendo com a saúde, estamos nós, operadores do direito, decidindo desde a construção de um hospital até a concessão de um medicamento não registrado ou registrado na Anvisa.”
Para ilustrar seu entendimento, Gebran Neto usou como exemplo um suposto acidente de trânsito em uma estrada próxima a Palmas, com muitos feridos com diferentes graus de gravidade, entre crianças, adultos e idosos. “Quem é a primeira pessoa que toma decisões nesse caso? Não é o Poder Judiciário”, afirmou, lembrando que possivelmente o primeiro seria alguém que estivesse passando no local na hora do acidente e acionasse a polícia rodoviária, depois os socorristas que, na avaliação de momento, decidiriam quem ainda poderia ser salvo. E num segundo momento seriam os médicos do hospital que decidiriam quem iria para a UTI, quarto, corredor…
“O que quero dizer com isso para os senhores é que, em um cenário de escassez, de falta absoluta de meios, com certeza não é o Poder Judiciário que vai tomar uma decisão”, frisou, ao ressaltar que na área de alocação de recursos “onde é possível eleger não o indivíduo, mas um grupo de indivíduos que vai receber algum tipo de atendimento. E como é que é feita essa alocação de recursos? Elegendo políticas publicas”.
Entre a gripe e a cirurgia bariátrica
O desembargador fez mais uma provocação com um exemplo concreto. “Pense se nós vamos atender a vacinação para a gripe a todas as pessoas ou se vamos fazer cirurgias bariátricas, para um grupo atendido muito menor com o mesmo recurso, ou se vamos pegar remédios na casa de milhões de reais, para atender uma pessoa que sofre distrofia muscular grave ou de outro tipo de doença muito grave”. Para arrematar, Gebran Neto lembrou que o levantamento do Justiça em Números do CNJ, divulgado neste mês, apurou que há 2 milhões de ações no Judiciário brasileiro versando sobre o direito da saúde, sendo a grande maioria tratando de saúde pública, e 40% de saúde suplementar. “Embora as lógicas de ambas não sejam necessariamente idênticas, o fato é que seja da saúde pública ou da suplementar, quando é determinado pelo Poder Judiciário uma certa providência, esta impacta a política dos demais grupos.”
Teses e decisões não cumpridas
O Fórum ainda abriu espaço para outras palestras, como a do desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) Renato Luís Dresch sobre a Aplicabilidade das Teses do Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal nas Demandas de Saúde Pública. Entre outros pontos, ele destacou que a ausência de registro na Agência Nacional de Saúde (Avisa) impede como regra geral o fornecimento de medicamento por decisão judicial, o mesmo ocorrendo para medicamento experimental.
Já na palestra Consequências do Descumprimento das Ordens Judiciais nas Decisões da Saúde Pública, o corregedor-geral do Ministério Público Federal (MPF), Oswaldo José Barbosa da Silva, lembrou, entre outros casos, que o gestor de saúde foi responsabilizado por crime de desobediência, quando o ente não era competente para assistir os usuários do SUS justificadamente. Questionado se o magistrado poderia ser acionado por uma decisão errada na saúde, o procurador lembrou: “Se cada juiz fosse responder pelos conteúdos de suas sentenças, desde que não seja queratológico ou de má fé, nós não teríamos Poder Judiciário. Quando eles erram e condenam gestores de saúde, até mesmo sendo competente para isso, o remédio é recorrer”.